CPI: Como funciona e quais os resultados de uma Comissão Parlamentar de Inquérito
Nos últimos dias, com o vazamento do relatório resultante da “CPI da pandemia“, o tema ganhou grande destaque. Notícias, especulações e manifestações públicas de autoridades tomaram a imprensa e as redes sociais.
O que mais chamou atenção foi o fato de que este relatório, redigido pelo Senador Renan Calheiros, propõe o indiciamento do Presidente da República, Jair Bolsonaro, por 11 crimes, incluindo homicídio, genocídio de indígenas e crime contra a humanidade. Além do Presidente, o relatório indica ainda quase 70 pessoas que teriam cometido crimes relacionados à pandemia.
Este relatório, contudo, ainda não é uma versão definitiva, uma vez que deverá ser discutido e aprovado pelos demais membros da CPI, que já demonstraram algumas ressalvas quanto às conclusões apresentadas pelo Senador Renan Calheiros.
A conclusão da CPI também não tem natureza de julgamento em relação às pessoas mencionadas. Os eventuais indiciamentos e condenações serão feitos pelos órgãos competentes de acordo com seu entendimento e convicção.
Para entendermos melhor estes detalhes da CPI e quais suas consequências na prática, destacamos algumas informações.
1.O que é uma CPI e como funciona?
O termo CPI é usado para se referir a uma Comissão Parlamentar de Inquérito. A Constituição Federal prevê a possibilidade de criação destas Comissões e quais suas funções e poderes em seu art. 58.
De forma bastante simples, as CPIs são grupos de parlamentares (deputados e/ou senadores) que são formados para a investigação de um fato que seja relevante à vida pública. É um instrumento para que a Câmara e o Senado cumpram um de seus papeis, que é o de fiscalizar a administração pública.
Desta forma, se for constatada a ocorrência de um fato que tenha impacto na ordem social, legal ou econômica do país, poderá ser instaurada uma Comissão que terá como objetivo a investigação deste fato.
As Comissões Parlamentares de Inquérito são sempre temporárias e têm um prazo certo. São criadas para aquela investigação específica e encerradas com o final dos trabalhos.
Em razão de seu objetivo e função, a Constituição dá às CPIs poderes de investigação de um órgão judicial. As Comissões podem ouvir testemunhas e investigados, determinar a quebra de sigilo bancário, fiscal e de dados, convocar Ministros, requisitar documentos e informações a órgãos públicos e, de forma genérica, realizar as diligências que entendam necessárias para a investigação.
Mesmo tendo estes poderes, nem todos os atos de uma autoridade judicial podem ser praticados pela CPI, que não tem competência, por exemplo, para determinar a instalação de escutas telefônicas. Assim, apesar de amplos os poderes da Comissão não são absolutos.
2. Quais as consequências da CPI?
Apesar de ter poderes de investigação uma CPI não pode processar ou impor penas a pessoas que entenda que tenham cometido crimes. Por este motivo muitas vezes se tem a impressão de que as Comissões Parlamentares de Inquérito não têm um efeito efetivo.
Conforme previsão da Constituição Federal, se em suas conclusões a CPI apontar o cometimento de infrações, o relatório final deverá ser encaminhado ao Ministério Público, cabendo a este órgão tomar as providências necessárias para o indiciamento dos investigados. Ocorre que o MP não é vinculado às conclusões da CPI, podendo discordar dos apontamentos e, neste caso, não prosseguir com os indiciamentos.
E mais. Mesmo que o MP concorde com as conclusões da Comissão e efetue denúncias, será aberto um processo judicial que passará por todos os trâmites de qualquer outro processo. Ao final, caberá ao Judiciário condenar ou não as pessoas indicadas.
Isso significa que as conclusões das Comissões Parlamentares de inquérito deverão passar pelo crivo do Ministério Público e do Judiciário, antes de qualquer condenação ou imposição de penalidade.
Na mesma linha, as CPIs não podem cassar mandatos de parlamentares, mas apenas sugerir a cassação, que deverá ser levada a efeito pelos órgãos competentes e de acordo com o procedimento específico. Novamente não há vinculação às conclusões da Comissão.
3. O que acontece se a CPI concluir que o Presidente da República cometeu crimes, como parece ser o caso da CPI da Pandemia?
No caso de serem atribuídos crimes ao Presidente no relatório final da CPI, o procedimento será o mesmo do que em relação a qualquer outra pessoa, com a diferença de que as autoridades que deverão tomar as providências são específicas.
Se for indicada a prática de crimes comuns, o relatório deverá ser encaminhado ao Procurador Geral da República, que é a autoridade responsável dentro do Ministério Público para apreciar as condutas do Presidente e oferecer denúncias ao Supremo Tribunal Federal, se assim entender pertinente.
Já se for o caso de apuração da prática de crimes de responsabilidade, o relatório poderá embasar a abertura de um processo de impeachment. Neste caso, a decisão de colocar em votação ou não o processo de impeachment é exclusiva do(a) Presidente(a) da Câmara dos Deputados.
Independente disso, as CPIs constituem um instrumento de grande relevância para a apuração de fatos que são do interesse de todo o país e para a abertura de debates públicos sobre estes fatos. Mesmo que os relatórios não culminem com condenações efetivas, têm um papel de extrema importância de trazer a toda a sociedade informações sobre fatos que a afetam diretamente e que de outro modo provavelmente permaneceriam inacessíveis.
Para saber mais sobre o tema, indicamos as páginas do Senado e da Câmara: